O pregoeiro, após a abertura da sessão pública e do envio de lances, pode conceder, aos licitantes, nova oportunidade para o envio de documentação de habilitação?
- Pedro Filipe Araújo de Albuquerque

- 11 de jan. de 2024
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O pregão eletrônico segue as seguintes fases sucessivas: I - planejamento da contratação; II - publicação do aviso de edital; III - apresentação de propostas e de documentos de habilitação; IV – abertura da sessão pública e envio de lances, ou fase competitiva; V - julgamento; VI - habilitação; VII - recursal; VIII - adjudicação; e IX - homologação (art. 6º do Decreto Federal n.º 10.024/2019).
Em regra, a apresentação da documentação de habilitação deve ser feita até a data e o horário estabelecidos para abertura da sessão pública, podendo o licitante retirá-la ou substituí-la até então, conforme estabelece o art. 26, caput, do Decreto Federal n.º 10.024/2019.
Entretanto, recentemente o Tribunal de Contas da União exarou importante julgado que relativiza essa regra geral. No Acórdão n.º 1211/2021 – TCU – Plenário (Relator: Ministro Walton Alencar Rodrigues), cuja sessão realizou-se no dia 26/05/2021, decidiu-se que:
“o pregoeiro, durante as fases de julgamento das propostas e/ou habilitação, deve sanear eventuais erros ou falhas que não alterem a substância das propostas, dos documentos e sua validade jurídica, mediante decisão fundamentada, registrada em ata e acessível aos licitantes, nos termos dos arts. 8º, inciso XII, alínea h; 17, inciso VI; e 47 do Decreto 10.024/2019; sendo que a vedação à inclusão de novo documento, prevista no art. 43, § 3º, da Lei 8.666/1993 e no art. 64 da Nova Lei de Licitações (Lei 14.133/2021), não alcança documento ausente, comprobatório de condição atendida pelo licitante quando apresentou sua proposta, que não foi juntado com os demais comprovantes de habilitação e/ou da proposta, por equívoco ou falha, o qual deverá ser solicitado e avaliado pelo pregoeiro”.
Em resumo, o caso concreto consistiu na seguinte situação:
“O representante alegou que o pregoeiro concedeu irregularmente, aos licitantes, nova oportunidade de envio da documentação de habilitação, após a abertura da sessão pública, o que beneficiou um único licitante, ao fim, declarado o vencedor do certame, e afrontou o disposto no Decreto 10.024/2019 e no edital de licitação. Ao verificar que a DAbM revogou o certame, em 26/5/2020 (peça 39), o auditor-instrutor propôs considerar a representação parcialmente procedente e dar ciência ao órgão de que a abertura de nova oportunidade, pelo Pregoeiro, no dia 05/05/2020, às 09:57:25hs, após iniciada a fase de julgamento de propostas, para que todos que os licitantes enviassem a documentação exigida no edital para fins de habilitação afronta o previsto nos arts. 19, inciso II, 25 e 26, §§ 6º e 9º, do Decreto 10.024/2019.”
Em seu voto, o Ministro Relator Walton Alencar Rodrigues, teceu considerações bastante elucidativas:
“Embora a regra atual seja a apresentação da documentação de habilitação até a data e o horário estabelecidos para abertura da sessão pública, podendo o licitante retirá-la ou substituí-la até então, nos termos do art. 26, caput, do recente Decreto 10.024/2019, o art. 47 do mesmo normativo abre a possibilidade, tanto na fase de julgamento das propostas quanto na de habilitação, de o pregoeiro sanar erros ou falhas que não alterem a substância das propostas, dos documentos e sua validade jurídica, mediante decisão fundamentada, registrada em ata e acessível aos licitantes. O art. 17, inciso VI, por sua vez, estabelece como dever do pregoeiro sanear erros ou falhas que não alterem a substância das propostas, dos documentos de habilitação e sua validade jurídica. (...) Como visto, a interpretação literal do termo ‘[documentos] já apresentados’ do art. 26, § 9º, do Decreto 10.024/2019 e da vedação à inclusão de documento ‘que deveria constar originariamente da proposta’, prevista no art. 43, § 3º, da Lei 8.666/1993 pode levar à prática de atos dissociados do interesse público, em que o procedimento licitatório (meio) prevalece e ganha maior importância que o resultado almejado, qual seja, a obtenção da proposta mais vantajosa para a Administração (fim). Imperioso observar que, visto por este prisma, a interpretação literal desses comandos legais vai contra o entendimento da jurisprudência deste Tribunal, no sentido de que o edital não constitui um fim em si mesmo. O edital de licitação constitui instrumento para a consecução das finalidades do certame licitatório, quais sejam, assegurar a contratação da proposta mais vantajosa para a Administração e a igualdade de oportunidade de participação dos interessados, nos termos do art. 3º, caput, da Lei 8.666/93. Dessa maneira, a interpretação e a aplicação das regras estabelecidas devem ter por norte o atingimento dessas finalidades, evitando-se o apego a formalismos exagerados, irrelevantes ou desarrazoados, que não contribuam para esse desiderato. As regras de licitações e a jurisprudência vêm evoluindo nesse sentido, sendo possível, por exemplo, ante à falta de juntada de comprovantes de regularidade fiscal pelo licitante, a consulta, pelo próprio agente público que conduz o certame, a sítios públicos em que constem tais documentos, nos termos do art. 40, parágrafo único, do Decreto 10.024/2019. Em alinhamento com esse entendimento, a vedação à inclusão de documento ‘que deveria constar originariamente da proposta’, prevista no art. 43, § 3º, da Lei 8.666/1993, deve se restringir ao que o licitante não dispunha materialmente no momento da licitação. Caso o documento ausente se refira a condição atendida pelo licitante quando apresentou sua proposta, e não foi entregue juntamente com os demais comprovantes de habilitação ou da proposta por equívoco ou falha, haverá de ser solicitado e avaliado pelo pregoeiro. Isso porque admitir a juntada de documentos que apenas venham a atestar condição preexistente à abertura da sessão pública do certame não fere os princípios da isonomia e igualdade entre as licitantes e o oposto, ou seja, a desclassificação do licitante, sem que lhe seja conferida oportunidade para sanear os seus documentos de habilitação, resulta em objetivo dissociado do interesse público, com a prevalência do processo (meio) sobre o resultado almejado (fim). Assim, nos termos dos dispositivos citados, inclusive do art. 64 da Lei 14.133/2021, entendo não haver vedação ao envio de documento que não altere ou modifique aquele anteriormente encaminhado. Por exemplo, se não foram apresentados atestados suficientes para demonstrar a habilitação técnica no certame, talvez em razão de conclusão equivocada do licitante de que os documentos encaminhados já seriam suficientes, poderia ser juntado, após essa verificação no julgamento da proposta, novos atestados de forma a complementar aqueles já enviados, desde que já existentes à época da entrega dos documentos de habilitação.”
Entendo que o Ministro acertou, ao decidir que o pregoeiro pode, após a abertura da sessão pública e do envio de lances (fase competitiva) conceder, aos licitantes, nova oportunidade para o envio de documentação de habilitação, nos termos explanados acima. De fato, a licitação não pode ser considerada um fim em si mesmo, mas sim um meio para realização do interesse público.
Texto de nosso advogado Dr. Pedro Albuquerque OAB/PB 30.558





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